20.2.06
7.2.06
- Sabes, é provável que tenhas que acabar por te contentar...
- Achas mesmo?
- Tenho a certeza quase dada por absoluta. Há sempre dúvidas, claro. Alguns chamam-lhe esperança, outros não lhe chamam nada. Não têm tempo para admirar a ilusão, para se apegarem a ela, para a catalogar. A realidade arrumaram-na há muito na gaveta, ainda que ela persista em escapar pela fechadura.
- Desde quando é que as gavetas têm fechaduras?
- Algumas têm. Aquelas que queremos salvar da curiosidade alheia. Pegamos numa chave pequena (ferrugenta) e trancamos os segredos lá dentro.
- Desde quando é que a realidade é segredo?
- Desde sempre. Ou acreditas mesmo que há alguma coisa dentro da gaveta?!
- Porque haverias de a querer fechar se estivesse vazia?
- Para me convencer de que não está, de facto.
- E é provável que não esteja.
- Tão provável como o teu inevitável e obrigatório contentamento.
- Certamente não o contentamento de quem dá pulos de alegria dentro de uma gaveta vazia.
- Não. Acho que é mais aquele contentamento de quem não pode esperar mais nem melhor. De quem está farto de esperar e percebe que não ganha muito com isso.
- Ganha tanto em esperar quanto em deixar de o fazer. Desde quando é que desistir se tornou a tua opção?
- Não é uma opção. Não há opção. Por isso é que o contentamento é inevitável, obrigatório.
- Ninguém me vai obrigar a não esperar.
- Nesse caso, tu és ninguém.
- Eu não me vou obrigar a isso. Obrigo-me todos os dias ao contrário, por vezes ao contrário do contrário, mas o que interessa realmente no meio de todas as obrigações é que a espera, gaveta cheia ou vazia, é o fundamento de seguir em frente impacientemente. Sempre a olhar para trás. À espera. Quando segues em frente, estás na verdade a percorrer quilómetros sem sair do mesmo lugar. Porque não esperar? Esperar distraidamente, numa pretensa correria rumo ao que vem ter connosco.
- Desculpa, mas não te cedo a minha concordância.
- Não faz mal. Para esperar (ou andar) basta-me a minha.
- Achas mesmo?
- Tenho a certeza quase dada por absoluta. Há sempre dúvidas, claro. Alguns chamam-lhe esperança, outros não lhe chamam nada. Não têm tempo para admirar a ilusão, para se apegarem a ela, para a catalogar. A realidade arrumaram-na há muito na gaveta, ainda que ela persista em escapar pela fechadura.
- Desde quando é que as gavetas têm fechaduras?
- Algumas têm. Aquelas que queremos salvar da curiosidade alheia. Pegamos numa chave pequena (ferrugenta) e trancamos os segredos lá dentro.
- Desde quando é que a realidade é segredo?
- Desde sempre. Ou acreditas mesmo que há alguma coisa dentro da gaveta?!
- Porque haverias de a querer fechar se estivesse vazia?
- Para me convencer de que não está, de facto.
- E é provável que não esteja.
- Tão provável como o teu inevitável e obrigatório contentamento.
- Certamente não o contentamento de quem dá pulos de alegria dentro de uma gaveta vazia.
- Não. Acho que é mais aquele contentamento de quem não pode esperar mais nem melhor. De quem está farto de esperar e percebe que não ganha muito com isso.
- Ganha tanto em esperar quanto em deixar de o fazer. Desde quando é que desistir se tornou a tua opção?
- Não é uma opção. Não há opção. Por isso é que o contentamento é inevitável, obrigatório.
- Ninguém me vai obrigar a não esperar.
- Nesse caso, tu és ninguém.
- Eu não me vou obrigar a isso. Obrigo-me todos os dias ao contrário, por vezes ao contrário do contrário, mas o que interessa realmente no meio de todas as obrigações é que a espera, gaveta cheia ou vazia, é o fundamento de seguir em frente impacientemente. Sempre a olhar para trás. À espera. Quando segues em frente, estás na verdade a percorrer quilómetros sem sair do mesmo lugar. Porque não esperar? Esperar distraidamente, numa pretensa correria rumo ao que vem ter connosco.
- Desculpa, mas não te cedo a minha concordância.
- Não faz mal. Para esperar (ou andar) basta-me a minha.
5.2.06
3.2.06
Diz-me que não faz mal não ter sono, não querer dormir (que é a mesma coisa, agora).
Diz que não faz mal se eu não acordar amanhã à hora dos desenhos animados, pegar na taça com ovelhas desenhadas no fundo - mas que interessam os desenhos no fundo se o leite e os cereais ficam sempre por cima? Às vezes é engraçado ver os contornos a aproximarem-se à medida que o leite se esgota... deve ser uma espécie de consolação. A imaginação supera a fome, mas só quando a fome já não existe. Não, não tenho fome de ti. Blerg... não sou canibal! Ahh, em sentido figurado... não, também não. Até tinha fome das tuas palavras, mas elas aterram sempre tão pesadas, tão frias, tão secas.
Diz que não faz mal se eu não acordar amanhã à hora dos desenhos animados, pegar na taça com ovelhas desenhadas no fundo - mas que interessam os desenhos no fundo se o leite e os cereais ficam sempre por cima? Às vezes é engraçado ver os contornos a aproximarem-se à medida que o leite se esgota... deve ser uma espécie de consolação. A imaginação supera a fome, mas só quando a fome já não existe. Não, não tenho fome de ti. Blerg... não sou canibal! Ahh, em sentido figurado... não, também não. Até tinha fome das tuas palavras, mas elas aterram sempre tão pesadas, tão frias, tão secas.
Hoje choveu.
Mas não molhou as tuas palavras.
Afinal as palavras não são nada, absolutamente nada, são caixas vazias que toda a gente - e eu, eu também, a toda a hora - enche de nadas, doces sim... E tal como o algodão doce parecem sempre maiores do que realmente são. Derretem na boca (não nas mãos), são sempre tão pequeninas e frágeis. Acabam sempre demasiado depressa. Uma nuvem cor-de-rosa gigantesca (e fofa!) não é mais que um pedaço duro de açúcar colorido artificialmente. Pormenores.
Alinhar as palavras ao meio...
Para parecerem mais bonitas, melhor colocadas.
Sim.
São palavras sentadas correctamente,
no seu trono de açúcar (demasiado) cor-de-rosa.
E afinal...
Esgotam-se.
As palavras esgotam-se.
Sim! Daqui a menos de uma vida a caixa das tuas palavras ter-se-á desfeito.
Segura-las na palma da mão, e então
Percebes que estiveste sempre a dizer a mesma coisa,
de maneiras diferentes e, PIOR,
sempre da mesma maneira.
Triste, não é?
Como se não bastasse, não tens sono.
Vai lá folhear a agenda, relembrar os compromissos de amanhã, amanhã que, note-se, deverá começar cedo, quando os desenhos ainda estão a maquilhar-se nos bastidores para entrar em cena. Em cena televisiva, claro. Sim, tu nunca te levantaste cedo para ver os bonecos. Isso é mesmo... adulto. Ou então, não. Não te lembras que toda a gente crescia sempre mais depressa do que tu? Já te esqueceste daqueles momentos marcantes em que a tua mãe se aproximava de ti e dizia, compreensivamente, que ninguém crescia ao mesmo tempo e que a tua até então melhor amiga, só por acaso, por golpe fatal do destino, estava a ultrapassar-te em centímetros psicológicos. Não tem mal, não te sintas pequena. Ergue-te na tua condição de completa (e patética) anã. Ainda gostamos de ti. Vamos sempre gostar de ti, só que já não estás no contexto... adeus...
Adeus, adeus...
Que palavra tão... terminal.
Um caixote a apontar a saída.
As pessoas mudam, as vontades também.
O tempo é o melhor remédio, so they say.
Concordo.
Com o tempo mortificam-se as saudades, as tristezas, a alma.
A vontade não muda.
A vontade morre.
Não, era a brincar.
Vamos dormir descansados esta noite.
Vamos fechar a cortina, arrumar as memórias e rasgar as histórias.
Só as contamos um dia aos nossos filhos, quando elas forem perfeitamente inofensivas.
Só quando pudermos um dia rir-nos delas.
Esqueçamos que somos tudo aquilo que elas nos contaram.
Tudo nos pinta, mas o desenho deve esquecer o criador, caso contrário acabará por lhe perder o amor. (A palavra ódio é uma caixa demasiado escura e sombria) Matá-lo-á quando já nada pode ser feito - tal Dorian Gray.
Não quero ser modelo.
Não quero que as memórias tristes me pintem,
por isso sorrio.
Sorrir resolve todos os meus problemas,
formula teorias de sistemas,
conquista a tal jovem, que mora na rua da utopia maçã de baunilha,
nº who gives a damn anyway,
essa jovem chamada felicidade.
Oh, vamos sorrir - o que é que custa?
Um sorriso nunca fez mal a ninguém.
E nada como viver para esquecer a vida.
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