7.2.06

- Sabes, é provável que tenhas que acabar por te contentar...
- Achas mesmo?
- Tenho a certeza quase dada por absoluta. Há sempre dúvidas, claro. Alguns chamam-lhe esperança, outros não lhe chamam nada. Não têm tempo para admirar a ilusão, para se apegarem a ela, para a catalogar. A realidade arrumaram-na há muito na gaveta, ainda que ela persista em escapar pela fechadura.
- Desde quando é que as gavetas têm fechaduras?
- Algumas têm. Aquelas que queremos salvar da curiosidade alheia. Pegamos numa chave pequena (ferrugenta) e trancamos os segredos lá dentro.
- Desde quando é que a realidade é segredo?
- Desde sempre. Ou acreditas mesmo que há alguma coisa dentro da gaveta?!
- Porque haverias de a querer fechar se estivesse vazia?
- Para me convencer de que não está, de facto.
- E é provável que não esteja.
- Tão provável como o teu inevitável e obrigatório contentamento.
- Certamente não o contentamento de quem dá pulos de alegria dentro de uma gaveta vazia.
- Não. Acho que é mais aquele contentamento de quem não pode esperar mais nem melhor. De quem está farto de esperar e percebe que não ganha muito com isso.
- Ganha tanto em esperar quanto em deixar de o fazer. Desde quando é que desistir se tornou a tua opção?
- Não é uma opção. Não há opção. Por isso é que o contentamento é inevitável, obrigatório.
- Ninguém me vai obrigar a não esperar.
- Nesse caso, tu és ninguém.
- Eu não me vou obrigar a isso. Obrigo-me todos os dias ao contrário, por vezes ao contrário do contrário, mas o que interessa realmente no meio de todas as obrigações é que a espera, gaveta cheia ou vazia, é o fundamento de seguir em frente impacientemente. Sempre a olhar para trás. À espera. Quando segues em frente, estás na verdade a percorrer quilómetros sem sair do mesmo lugar. Porque não esperar? Esperar distraidamente, numa pretensa correria rumo ao que vem ter connosco.
- Desculpa, mas não te cedo a minha concordância.
- Não faz mal. Para esperar (ou andar) basta-me a minha.

3 comentários:

[lunatic] disse...

Não te contentes nunca minina... e deixa a gaveta da realidade bem fexada, porque ela devora os sonhos, que são a única coisa que nos faz ser realmente pessoas! Ja tinha dito, mas ptx escreves muiiiiito bem tens aki uma leitora assídua ;) beijos

StupiDreamer disse...

será que algum dia encheremos a gaveta? =/ *

player1331 disse...

- há sempre uma opção...pq tu és dona e senhora de ti...logo tu tens uma opção...
- no entanto não será uma opção entre a realidade e a ilusão...porque tu não tens realmente a opção de escolheres se queres viver numa ou noutra...a gaveta raramente se mantém fechada ou aberta...está num meio termo...essa é a tua opção...
- será que queres viver a realidade com ilusão...ou ilusão com realidade...
- nesse ponto cedo-te a minha concordância, no entanto acho que às vezes mais vale apena esperar do que andar...
- mas às vezes é preciso andar para podermos esperar...porque se a vida vem tão inevitavelmente contra nós, nós teremos de ir inevitavelmente contra a vida, e o que nos espera corre contra nós, logo nós também estaremos a correr contra o que há-de vir...embora estejamos à espera...
- então qual é a importância de te ceder a minha concordância?
- nenhuma...
- no entanto era inevitávek ceder-ta não era?
- sim...não...talvez...um meio termo...chama-lhe a gaveta entreaberta...

Percebeste Agui??? gosto de ti :D