Don't drive. Walk.
24.1.10
Muda de direcção. Vira à esquerda ou à direita, mas não fiques nem mais um segundo. Aqui passou à história e tu viraste a esquina, sem olhar para trás.
Muda de ideias, lembra-te que as ideias são só isso e que por si só não são nada, não obstante as novas filosofias do poder da mente ou uma lei da atracção. A realidade é outra coisa, livre desses pensamentos que avariam a fruição desencantada mas genuína do que existe, seja lá isso o que for.
Muda de atmosfera. Sai cá para fora. Se cá fora está frio, entra num café onde o ar é demasiado abafado e as pessoas riem alto e a felicidade delas não contagia. Sai de novo e respira fundo até sentires a urgência de uma casa, onde se janta a horas e se fala de coisas banais e se discute porque se sente o laço relutante da afinidade.
Não. Não se diz não só por dizer. Há sempre uma razão qualquer, que se ignora, que se contesta pelo confronto com o procedimento normal, que se conclui ser apanágio de uma intuição protectora, amigável. Enquanto ainda não sei porque disse não, lamento não ter dito sim. Tudo aponta para o erro crasso repetido até à exaustão e a tua mão padece o meu remorso.
Eu sonho que não me enganei, enquanto mudo de direcção. Vejo de relance a parede contra a qual não me despenhei - aviãozinho de sonhos fora do contexto. Foi por pouco. Mas dou outras tantas voltas ao volante, como quem volta ao mesmo lugar, só para ter a certeza que não me enganei que me enganei. O caminho está cortado. «Isto é um assunto sério, o que é que estás a fazer? Volta para casa. Não, não cantes. Não te vais sentir melhor por causa disso. Nestas coisas não resulta, é outro campeonato. Faz assim: Na primeira oportunidade, assim que vires um caixote do lixo com ar sóbrio, digno, deita o coração fora. Despeja-o como quem oferece um peso insuportável à gravidade, e continua a andar como se nada fosse.»
Encontro-te na esquina. Perguntas-me o que estou a fazer, se aquilo é o meu coração. Comentas como quem ridiculariza o desperdício de um coração em bom estado. Mal sabes tu o que lhe fizeste. Se te dissesse ias-te rir na minha cara, ou pior, fazer aquele ar condescendente - golpe certeiro. Mas não é. É ao lado. Vês-me onde eu não estou, quando falas comigo não é para mim e se me tocas é a tua pele que sentes. Sentes o acessório e os contornos que reconheces e queres para ti, como se não existisse mais ninguém - só tu e tu, e tudo aquilo que podes ter.
E como sei que só sabes ler a introdução - entre bocejos, sentado em cima dos óculos, como quem não consegue tentar -, mudo de direcção e levo os contornos comigo. Se é um erro, tenho mesmo que o cometer. É o erro certo. Não é ideia minha e não é coisa que o coração possa discernir.
Quando for tarde demais, não se vai dizer «É tarde demais». Não se vai dizer nada.
Muda de ideias, lembra-te que as ideias são só isso e que por si só não são nada, não obstante as novas filosofias do poder da mente ou uma lei da atracção. A realidade é outra coisa, livre desses pensamentos que avariam a fruição desencantada mas genuína do que existe, seja lá isso o que for.
Muda de atmosfera. Sai cá para fora. Se cá fora está frio, entra num café onde o ar é demasiado abafado e as pessoas riem alto e a felicidade delas não contagia. Sai de novo e respira fundo até sentires a urgência de uma casa, onde se janta a horas e se fala de coisas banais e se discute porque se sente o laço relutante da afinidade.
Não. Não se diz não só por dizer. Há sempre uma razão qualquer, que se ignora, que se contesta pelo confronto com o procedimento normal, que se conclui ser apanágio de uma intuição protectora, amigável. Enquanto ainda não sei porque disse não, lamento não ter dito sim. Tudo aponta para o erro crasso repetido até à exaustão e a tua mão padece o meu remorso.
Eu sonho que não me enganei, enquanto mudo de direcção. Vejo de relance a parede contra a qual não me despenhei - aviãozinho de sonhos fora do contexto. Foi por pouco. Mas dou outras tantas voltas ao volante, como quem volta ao mesmo lugar, só para ter a certeza que não me enganei que me enganei. O caminho está cortado. «Isto é um assunto sério, o que é que estás a fazer? Volta para casa. Não, não cantes. Não te vais sentir melhor por causa disso. Nestas coisas não resulta, é outro campeonato. Faz assim: Na primeira oportunidade, assim que vires um caixote do lixo com ar sóbrio, digno, deita o coração fora. Despeja-o como quem oferece um peso insuportável à gravidade, e continua a andar como se nada fosse.»
Encontro-te na esquina. Perguntas-me o que estou a fazer, se aquilo é o meu coração. Comentas como quem ridiculariza o desperdício de um coração em bom estado. Mal sabes tu o que lhe fizeste. Se te dissesse ias-te rir na minha cara, ou pior, fazer aquele ar condescendente - golpe certeiro. Mas não é. É ao lado. Vês-me onde eu não estou, quando falas comigo não é para mim e se me tocas é a tua pele que sentes. Sentes o acessório e os contornos que reconheces e queres para ti, como se não existisse mais ninguém - só tu e tu, e tudo aquilo que podes ter.
E como sei que só sabes ler a introdução - entre bocejos, sentado em cima dos óculos, como quem não consegue tentar -, mudo de direcção e levo os contornos comigo. Se é um erro, tenho mesmo que o cometer. É o erro certo. Não é ideia minha e não é coisa que o coração possa discernir.
Quando for tarde demais, não se vai dizer «É tarde demais». Não se vai dizer nada.
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