17.12.09

Y - Eu não sei coser. Faz mal?

X - Não.

Y - De certeza?

X - Absoluta.

Y - Não te importas? (silêncio) Sei fazer algumas coisas, mas coser não.

X - Não se cose, então.

Y - Podemos falar?

X - Sobre o quê?

Y - Sobre qualquer coisa.

X - Mas queres dizer alguma coisa em especial?

Y - Não. Tu queres?

X - Não. Mas podemos falar.

Y - Podemos fazer o que eu quiser?

X - De vez em quando.

Y - E o que tu quiseres?

X - De vez em quando também.

Y - E o que é que fazemos quando não estivermos a fazer o que tu queres ou o que eu quero?

X - O que calhar.

Y - E se nos fartarmos?

X - Não fazemos nada.

Y - E se nos fartarmos de não fazer nada?

X - Fazemos qualquer coisa.

Y - E se nos fartarmos um do outro?

X - Tu voltas para a tua casa e eu para a minha.

Y - E se eu já não morar lá? As pessoas ficam diferentes depois destas coisas. E se for tarde demais para me ir embora?

X - Mais tarde ou mais cedo temos que ir embora.

Y - E isso é mais cedo ou mais tarde?

X - Quando for. Não faças tantas perguntas.

Y - Só pergunto porque quero saber.

X - Não podes saber sempre tudo.

Y - Está bem, mas às vezes as coisas não fazem sentido e eu preciso que elas façam pelo menos algum sentido. Não é preciso muito.

X - Não tens frio?

Y - Não, tu tens?

X - Estou a morrer de frio.

Y - (após uma longa pausa) Se morresses ia-me fazer imensa confusão.

X ri.

Y - A sério. Se te acontecesse alguma coisa e me telefonassem a dar a má notícia ou a dizer que tinhas ido parar ao hospital, o meu coração ia encolher como uma ervilha esmagada ao meio. Há outras pessoas que me fazem rir e que têm coisas bonitas, coisas de que eu gosto, mas se lhes acontecesse alguma coisa não me ia fazer tanta confusão. Isso deve querer dizer que me importo contigo. Às vezes penso em ti e até te acho antipático, não sei porquê. Mas as coisas que não são bonitas em ti cativam-me mais que a beleza de muitas pessoas. (pausa) Nem me lembro de ter frio. Mas tu lembras-te. É mau sinal.

X - Não digas disparates. Há outras coisas de que não me lembro quando estou ao pé de ti.

Y - A falha de memória é sinónimo de apreço?

X - Pode ser.

Y - Secalhar era melhor pormos uma pedra sobre o assunto. Isto pode correr mal.

X - Se correr mal, fazemos as malas e vamo-nos embora. Tu segues o teu caminho e eu sigo o meu.

Y - Eu não tenho bom sentido de orientação. Mas o meu sempre é melhor que o teu. Ainda nos perdíamos e aí precisávamos mesmo um do outro e não sabíamos como nos encontrar.

X - Quando lá chegarmos logo pensamos no assunto. Ainda é cedo. Dorme e não me faças mais perguntas.

(silêncio)

Y - Já estás a dormir?

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