Já nem o escrever sinto. Não é meu. E o que dá vida às
minhas palavras, a ponte que desfaz o abismo que nos
separa...? Pequenos quadrados de plástico... sem cor,
sem toque, sem vida... pequenos pedaços de um nada que nem nada é... até o nada tem vida, até o nada...
Triste ponte feita de menos de nada é quem carrega as minhas palavras e
as torna aquilo que elas são...
e assim deixam elas de ser quem eu sou. Seja eu quem for.
Mas fazes-me falta, sabes? Contemplar-te na tua indiferença, ser perturbada pelo ruído do teu silêncio.
Não, não me importo.
Passo o tempo á espera do momento em que deixas de morar em mim
e vens morar comigo neste esboço ingénuo de mundo...
Mas dói o teu silêncio. Ou o vazio das poucas palavras que te ouço...
Porque sei que são tão tuas como
minhas as que estranho...
Se assim é, deixa antes o teu silêncio dar-me a mão... faz-me mais companhia que os diálogos ensurdecedores da multidão...
E quando não estás... sinto-te mais que ao próprio corpo que trago cosido
à alma que o rejeita...
Rebento os pontos...
Rasgo a pele.
Nada me importa.
Mas vivo de tudo.
Vivo do teu silêncio, que é tudo o que me dás. Os gritos que me afligem no leve sussurrar dos teus olhos...
Queres salvar a minha alma?
Deixa-me salvar a tua...