14.3.07

Plataforma____________________Os passos que desenhava nela tão pequenos em chão percorrido. Facilmente despercebidos (passavam) ao olhar propositada e pretensiosamente enfeitado pelos restantes futuro-passageiros com um brilho de despreocupação, movendo-se (não obstante) à contraditória velocidade da luz - rotina degenerada em entretenimento. Os pensamentos contagiando com a sua euforia as mãos que disfarçadamente desarrumavam o conteúdo (por si só já pouco não caótico na sua disposição) da mochila, mala, carteira, bolso, ar... _______________________Os pés que desenhavam os passos inexistentes para aquele comum modo-de-olhar humano seguidos num movimento ascendente pelas calças engomadas em tom de perfeição e de castanho escuro também, o casaco pousado nos ombros numa contra-moda de sobriedade, a pele que se deixava vislumbrar nos intervalos de nudez socialmente aceitável - mãos, pescoço, cara - quase translúcida na sua total falta de transparência que em dureza lhe negava a existência.

Ela sonhava um dia desalinhar-lhe o cabelo que adivinhava matematicamente
penteado debaixo do chapéu que queria pisar de redondo-achatado para
uma outra forma qualquer. Uma qualquer. Outra.

Desejava - não ela, mas a curiosidade que a provocava em silêncio - redesenhar
a linha estreita e inabalavelmente recta que mais que eixo era invólucro daquele
frágil mas indestrutível soldadinho de chumbo-peso-de-pena. Amputar-lhe
a linearidade. Dividir aquele ponto de fuga irrepreensível em pequenos cortes de vazio.
Inventar com eles pequenos abstractos no realismo que poderia jurar ligeiramente inquieto...
não fosse a cegueira que cobria
de quietude os passos de mais um
desconhecido...